Barulho no Condomínio. Como resolver esse problema com o meu vizinho?

19

jul | 2021

Barulho no Condomínio. Como resolver esse problema com o meu vizinho?

Segundo o Art. 1.336, do CC: São deveres do condômino: IV - dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes. (Grifamos).

 

O artigo supra dispõe que o condômino é obrigado a usar a sua propriedade de maneira que não cause prejuízo aos demais condôminos, evitando situações em que prejudique o sossego, a salubridade, a segurança e os bons costumes.

 

A preservação ao sossego deve ser o tempo todo observado por síndicos e moradores, dentro ou fora do Condomínio.

 

Contudo, viver em sociedade com outros seres humanos não é uma tarefa assim tão fácil. As pessoas são completamente diferentes e com costumes e diferentes, certamente, surgindo uma colisão de interesses e opiniões.

 

Por isso, o síndico possui alguns expedientes para realizar o controle desses “abusos ou excessos”, podendo aplicar advertências ou multas, conforme o caso.

 

Caso a Convenção ou o Regimento Interno não trate expressamente de cada caso de prejuízo à tranquilidade e à paz dentro do Condomínio, o síndico poderá usar esse artigo 1.336, inc. IV, do Código Civil, como um “coringa”, para TODAS às situações que requer a intervenção do Condomínio, para evitar maiores conflitos e aborrecimentos dentro do ambiente Condominial.

 

A Convenção ou o Regimento Interno costuma definir os horários em que se deve preservar o silêncio, geralmente, das 22 (vinte e duas) horas até às 08 (oito) horas da manhã seguinte. Mas isso pode variar de acordo com cada Condomínio. Vale conferir o que está escrito nas normas internas do Condomínio. Peça uma cópia desses documentos ao síndico ou à Administradora. Também é possível solicitar uma cópia desses documentos nos Cartórios em que o Condomínio está cadastrado.

 

Com efeito, há quem mede o barulho produzido por seus vizinhos com aparelhos (decibelímetro), apurando os “decibéis”. Mas não precisamos chegar a tanta tecnologia! O maior dos problemas é justamente saber até onde vai o “excesso” desse barulho.

 

Vejamos alguns casos hipotéticos de problemas com barulhos que costumam se repetir:

 

“O condômino do apartamento do andar acima resolve à meia noite, pegar uma furadeira e realizar alguns reparos em seu apartamento, tirando o sono de todos no prédio”.

 

“Outra moradora, decide ligar a barulhenta máquina de lavar 5 horas da manhã, acordando todos os condôminos”.

 

“Os filhos do vizinho do apartamento ao lado, transformaram a sala em um campo de futebol, correndo e gritando”.

 

“O cachorro do vizinho começou a latir alto às 9 horas da manhã quando o seu dono foi trabalhar, e só para de latir às 18 horas quando o voltou do trabalho”.

 

“A vizinha da frente gosta de ouvir música no último volume do rádio, e ainda cantar alto incomodando a todos”.

 

“A obra no apartamento do vizinho parece que não acaba nunca e dá a sensação que vai cair tudo encima da minha cabeça”.

 

“O casal ao lado vive brigando e discutindo em tom alto, com bater de portas”[1].

 

Se alguns desses relatos já aconteceram com o leitor, parabéns, porque esses casos não são mera coincidência, ocorrem a todo o momento nos Condomínios.

 

A melhor solução para todos esses casos é o diálogo e a composição entre às próprias partes.

 

O síndico deve buscar e incentivar a conciliação o tempo momento, proporcionando um ambiente saudável e harmônico para todos. Não poderá o síndico ou o Administradora, simplesmente, se isentar do problema, alegando que não tem nada a ver com os assuntos pessoais entre aqueles condôminos.

 

Primeiramente, osíndico deve investigar se a reclamação procede ou se trata de “picuinhas” pessoais entres oscondôminos. Por exemplo, conversando com funcionários do Condomínio ou outros condôminos e indagando sejá testemunharam a ocorrência de barulho excessivos vindos do apartamento reclamado. Também vale verificaro livro de ocorrênciasque é aquele documento que costuma ficar na portaria ou com a Administradora, para apurar se já existe um histórico de reclamações daquele mesmo condômino supostamente barulhento e inconveniente.

 

Por outro lado, caso o síndico constate que o barulho é quase “insignificante” ou, até mesmo, que trata de um “problema de ordem pessoal” entre aqueles próprios condôminos vizinhos, daí a solução é apenas tentar conciliar ambos, para que se respeitem e possam conviver harmoniosamente dentro do mesmo ambiente condominial.

 

Muitas vezes o barulho é apenas dentro da própria unidade do condômino e nenhum outro vizinho de andar consegue ouvir o barulho, visto que às construções atualmente possuem uma acústica prejudicada com paredes chamadas popularmente de “casca de ovo”, muito sensíveis a qualquer barulhinho que reverbera no apartamento facilmente.

 

Mas isso não quer dizer que o barulho não exista!

 

Há muitos relatos de que de fato o barulho incomodativo vem do andar que está logo acima do apartamento abaixo, o qual, é o único que escuta e não aguenta mais o barulho. A citar exemplos, como; andar de salto alto, objetos que caem ao chão, arrastar de cadeiras e móveis, criança correndo, dentre outros barulhos que somente são percebidos por quem está no andar abaixo. Nestes casos, recomenda-se que o síndico ou algum funcionário do Condomínio vá até o apartamento para ouvir o barulho, registrando no livro de ocorrências e testemunhando o incomodo. Isso poderá até servir de provas numa futura ação judicial.

 

Contudo, por óbvio uma certa tolerância deverá ser suportada pelo condômino incomodado com o barulho do seu vizinho, afinal, não está morando em um local isolado na natureza, como uma casa no campo, mas sim está convivendo em um ambiente que pode ser tratar de uma metrópole bastante barulhenta.

 

É muito comum, inclusive, que em regiões mais afastadas dos centros urbanos, que a tolerância ao barulho é até mesmo suportável, o que não ocorre em por exemplo, em locais mais afastados ou até mesmo em bairros mais arborizados em que qualquer barulho é facilmente percebido e incomoda bastante.

 

De modo que soluções práticas, muitas vezes ajudam a “minimizar” os incômodos, a citar: a colocação de tapetes, o fechamento ou a vedação das janelas em horários mais tranquilos, evitar de ouvir música em alto volume em horários de descanso, evitar de realizar obras e reformas em horários não previstos no Regimento, educar mais os filhos para não gritarem o tempo todo, enfim, tentar conviver com o colega ao lado, etc.

 

Porém, existem situações excessivas e periódicas de barulhos, em que não há mais como ser tolerável pelo condômino incomodado, o qual, já se começa a indagar senão é o caso de se mudar para outro local. O que seria um total absurdo, pois não são os incomodados quem devem se mudar do prédio, mas sim o vizinho barulhento e que não respeita as normas internas!

 

Dessa modo, uma vez sendo constatado que de fato o condômino é uma pessoa que incomoda ao excesso os demais condôminos, e não resolvido o caso amigavelmente, deverá o síndico tomar providências e não se “omitir” com a situação, providenciando o encaminhamento de uma “advertência” ou até mesmo uma “multa”, se for o caso de reincidência dos barulhos.

 

Lembrando que o síndico poderá majorar às multas conforme previsto em Convenção, até “doer no bolso” do condômino barulhento, para que comece a lhe acarretar alguma consequência ao menos financeira, visando desestimular a conduta.

 

E se o condômino barulhento for inquilino?

 

A relação jurídica existe apenas entre o Condomínio e o proprietário-locador, de modo que deverá o síndico, por força da na Lei de Locações (8.245/91) e também do que consta do contrato de locação - geralmente existe uma cláusula prevendo que o inquilino deve respeitar às normas internas do Condomínio, aderindo o contrato de locação ao regimento - sempre comunicar ao proprietário-locador todos às advertências e multas aplicadas por seu inquilino, no intuito de que o proprietário tome às providências que entender perante o seu inquilino como, por exemplo, aplicar multas prevista no contrato de locação e até mesmo o despejo por descumprimento ao mesmo contrato e, subsequentemente, às normas internas do Condomínio às quais o inquilino está vinculado e deve respeitar.In verbis:

 

“Art. 23. O locatário é obrigado a: X - cumprir integralmente a convenção de condomínio e os regulamentos internos”. (Grifamos).

 

Nesse sentido, vale destacar a doutrina do saudoso jurista Sylvio Capanema de Souza[2], o qual, ensina que a relação jurídica entre locador e locatário não se aplica ao condomínio, porém, o inquilino deve respeitar a convenção e regimento que são públicos, de modo que é sim possível move ação contra o proprietário para que este dê uma solução aos problemas gerados por seu inquilino, respondendo solidariamente, de maneira que poderá também entrar com ação em regresso aos danos gerados por seus inquilinos, confira:

 

“Impõe dar conhecimento ao locatário da Convenção e do Regimento Interno, para que ele os respeite. A violação de seus dispositivos traduz infração à obrigação legal, ensejadora na ação de despejo. (...) Discute-se, então, se seria o inquilino o destinatário da sanção, já que dele partiu a conduta infracional, ou de seus prepostos ou representados. Sustentam uns que a legitimidade passiva seria apenas do locador, que é o condômino, não mantendo o locatário vinculo jurídico direto com o condomínio, cabendo-lhe, depois, direito de regresso para recuperar o que pagou. (...) Insiste-se, entretanto, com o argumento de que teria o condômino-locador que exercer a vigilância sobre o comportamento do locatário que escolheu, para confiar-lhe a posse” (grifamos).

 

Portanto, se o caso realmente é completamente insuportável ao condômino e o barulho persiste e passa do que chamamos de “bom senso”, causando bastante aborrecimento, estresse e até mesmo conflitos entre os vizinhos; o mais recomendado – superadas às multas e tentativas de conciliação por parte do síndico – é que o próprio condômino incomodado procure os seus direitos na Justiça, por exemplo, entrando com uma ação que imponha uma multa diária para fazer cessar essas barulhos, bem como a indenização pelos danos materiais e morais sofridos.

 

[1] Casos reais exemplificados pelo próprio autor, porém preservado o nome das partes envolvidas.

[2]A Lei do Inquilinato Comentada, 9ªed., Rio de Janeiro: Forense, 2014, págs. 132/133.

Alexandre Callé

Alexandre Callé

Possui especialização em Direito Imobiliário. O escritório presta assessoria jurídica para Condomínios (ou condôminos), Administradoras, Incorporadoras, Empresas do Setor e Consumidores em Geral.