Em briga de marido e mulher, vizinho e funcionário metem a colher! 13º aniversário da Lei Maria da Penha. Como interferir em brigas de vizinhos?

08

ago | 2019

Em briga de marido e mulher, vizinho e funcionário metem a colher! 13º aniversário da Lei Maria da Penha. Como interferir em brigas de vizinhos?

Os números sobre a violência contra a mulher são ALARMANTES. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil ocupa a vergonhosa posição de quarto pior país no ranking da violência contra a mulher.

Paradoxalmente, Desde a sua publicação, a lei Maria da Penha, que hoje completa 13 anos, é considerada pela Organização das Nações Unidas como  uma das três melhores legislações do mundo no enfrentamento à violência contra as mulheres. Essa é a grande diferença entre entre prática e realidade!

Sobre a legislação: O nome dado à Lei nº 11.340/2006, que combate a violência doméstica e familiar, foi em homenagem à professora universitária Maria da Penha Meia, que por 23 anos de casamento sofreu violência doméstica causada por seu marido. Em 1983, o marido por duas vezes, tentou assassiná-la. Na primeira vez, com arma de fogo, deixando-a paraplégica, e na segunda, por eletrocussão e afogamento. (para ter acesso ao conteúdo integral da lei, clique aqui )

Mesmo 13 anos depois e com toda a tecnologia que dotamos hoje, surpreende que casos como o da advogada Tatiane Spitzner que foi agredida na garagem, no elevador e agredida por 20 minutos, chegando a ajuda da polícia já tarde.

A Lei Maria da Penha, cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, dispõe de medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar e estabelece (i) as formas de violência doméstica contra a mulher como física, psicológica, sexual, patrimonial e moral; (ii) tipifica e define a violência doméstica e familiar contra a mulher; (iii) proíbe as penas pecuniárias (pagamento de multas ou cestas básicas); (iv) determina que a mulher somente poderá renunciar à denúncia perante o juiz; (v) possibilita ao juiz a decretação da prisão preventiva quando houver riscos à integridade física ou psicológica da mulher; (vi) permite ao juiz que determine o comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação; e (vii) estabelece um aumento de pena em um terço caso a violência doméstica seja cometida contra mulher com deficiência.

A Lei não se aplica a mulher de forma indiscriminada. Faz-se necessários 3 requisitos para incidência da Lei Maria da Penha (art. 5º):

  • A vítima precisa ser mulher (há uma grande discussão sobre qual é a amplitude da expressão mulher, há quem entenda ser o transexual – uma vez que fez a cirurgia, que mudou o seu nome social, mas nem o STF nem o STJ ainda não apreciou tal questão, há apenas decisões de Tribunais de Justiça Estaduais adminitindo a aplicação da lei maria da penha a trans)
  • Essa mulher deve sofrer qualquer ação ou omissão baseada no gênero (dolo de gênero ou violência de gênero)
  • Esse dolo precisa ser aplicado em um deses ambitos: ambito doméstico, ambito familiar ou seja em qualquer relação íntima ou de afeto.

Qual o papel e postura dos vizinhos diante de ocorrências ou suspeitas de violência doméstica ou familiar?

O que torna a questão difícil é o fato de que a ajuda pode trazer problemas a quem pretendeu auxiliar. Dois problemas envolvem o dilema: denunciar sem provas (especialmente quando a denúncia não for anônima) e sem o reconhecimento da vítima da agressão.

1º problema: Denunciar sem provas pode levar a uma denunciação caluniosa ou à comunicação falsa de crime, ambas infrações penais. Por isso a primeira sugestão é de sempre gravar a situação, ainda que dentro das dependências de sua própria unidade ou das áreas comuns. E se possível, pedir ao síndico as imagens das câmeras de segurança, incluindo elevador, e que os funcionários se mantenham alertas para que possam auxiliar na confecção das provas. Lembrando que se houver medida protetiva decretada, pode ser possível inclusive a restrição de entrada.

2º problema: Violência e Crime vs Discussão – é preciso ter em mente a possibilidade de não estar havendo agressão nem violência, o que precisa ser sempre verificado antes de qualquer conclusão e comunicação precipitada. Por isso, recomenda-se comunicar a percepção dos vizinhos sobre a situação e eventuais reclamações.

3º problema: Mesmo um terceiro prestando todo o auxílio, há ainda a possibilidade da agredida não se reconhecer como vítima. Porém, em que pese haver uma controvérsia, é primordial que se saiba que hoje em dia a Lei Maria da Penha pode ser conduzida por meio de uma ação que independe da vontade ou representação da vítima, por se considerar haver interesse público na condução do processo.

Dito isto, listamos as possibilidades:

- A primeira porta é, no momento da agressão,verbal ou moral, fazer provas, pelo celular ou da forma possivel, do barulho ou de qualquer indício que leve a demonstrar os fatos;
- Fazer denúncia anônima pelo Disque denúncia de crimes contra a mulher: 180;
- Ou fazer denúncia anônima pelo Disque denúncia: 181;
- Denúncia anônima no site da Polícia Civil: na normativa evite usar expressões que permitam a identificação como “minha vizinha de porta ao lado”. O correto é citar o endereço do prédio; número do apartamento...;
- Nos casos de emergência, de fatos a ocorrer naquel momento, ligue: 190.

Por fim, há de se evitar casos com o de Bruno Oliveira dos Santos quando, agredida pelo marido com pé de cabe, batia nas portas e ninguém respondia.

Postura do síndico diante de ocorrências e projeto de lei nº 1316/2019.

O síndico, representando o condomínio, deve auxiliar, da forma possível, na apuração das infrações ocorridas nas dependências do condomínio, não apenas pelo âmbito moral como também pelo âmbito jurídico em atenção aos deveres insculpidos no Código Civil ao síndico no sentido de fazer cumprir as normas internas, especificamente àquelas atinentes ao sossego e ordem.

Ademais, houve uma prática adotada em um condomínio em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, que instalou placas informativas e orientou os funcionários a acionarem a Polícia Militar em casos de agressão doméstica contra mulheres e crianças, regulamentando minimamente funcionários e moradores do condomínio interfiram, sim. Aliás, a polícia militar pode ser acionada em qualquer tipo de agressão, não apenas em casos contra mulheres e crianças. Briga de irmãos e de jovens não moradores no salão de festas, por exemplo, também.

Com base nesta ocorrência, surgiu o projeto de lei nº 1316/2019 na Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro, que obriga os condomínios residenciais e comerciais a orientarem seus funcionários a como procederem e afixarem placas e/ou cartazes informando os números das centrais de atendimento em casos de violência doméstica.

Amanda Torres Lobão

Amanda Torres Lobão

Especialista em Direito Imobiliário, Mestre em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), Mestre em Direito Processual pela Universidade Nacional de Rosário da Argentina (UNR), Especialista em Grandes Teses Tributárias pela Universidade Tributária, Curso de Administração em condomínios por Prime Cursos.